top of page
  • Branca Ícone Instagram
  • Ícone do Facebook Branco
  • X
  • TikTok

Não existe segurança no Brasil

Por qual motivo alguém busca a tutela do Poder Judiciário? Embora a resposta “para ver seu direito assegurado” seja o reflexo natural a esse questionamento, eu acrescentaria que muitos buscam o Judiciário para que seja dado um ponto final à questão discutida.


Ao buscar a tutela jurisdicional, o cidadão espera que algo seja decidido e, uma vez que assim o tenha sido, que essa decisão seja respeitada. Que seja dada a última palavra e que a pessoa saiba como se aplica o seu direito naquela questão e como ela deve proceder diante da situação que a levou a acionar o Poder Judiciário. Ou seja, o cidadão espera que, além de ver seu direito satisfeito, seja formada coisa julgada sobre a questão.


Denomina-se “coisa julgada” a qualidade conferida à sentença judicial contra a qual não cabem mais recursos, tornando-a imutável e indiscutível. Tal conceito é essencial para o próprio funcionamento do Estado de Direito, pois é através da coisa julgada que o cidadão passa a ter certeza e previsibilidade de como o Direito é aplicado a seu imbróglio e de que o Estado, de fato, tem o poder de tutelar os conflitos sociais.


No entanto, embora tal conceito seja essencial para a própria efetividade do Poder Judiciário, o Supremo Tribunal Federal (STF), na última semana, formou maioria no julgamento dos temas 881 e 885 para determinar que, em matéria tributária, a coisa julgada pode ser quebrada automaticamente, o que representa um cenário de grande insegurança jurídica para os contribuintes brasileiros. Explico.


Basicamente, o julgamento do STF se destinava a decidir se um contribuinte que havia obtido uma decisão judicial favorável determinando o não pagamento de um tributo poderia perder o seu direito automaticamente diante de uma nova decisão do STF que considerasse a cobrança constitucional.


Vamos ilustrar: imagine que João, empresário, ingressa com uma ação judicial para que seja afastada a cobrança de um imposto que ele entende indevido e inconstitucional. João vence a ação e em 2023 ocorre o trânsito em julgado, formando coisa julgada. Ou seja, não cabem mais recursos da decisão que lhe foi favorável, de forma que essa é, em tese, imutável e indiscutível, conferindo a João o seu direito de (nesse caso) não pagar o imposto.


Contudo, imagine que 7 anos depois, em 2030, o STF, em ação em que exerça controle de constitucionalidade, decida que aquele imposto é, na verdade, constitucional. Isso significa que a decisão favorável que João tinha e a coisa julgada que lhe foi conferida perderia a eficácia automaticamente. Logo, o imposto pode ser cobrado de João, mesmo que ele tenha uma decisão favorável e transitada em julgado dizendo que a cobrança não pode ser feita.


Num primeiro olhar, a questão não parece tão problemática. Ora, se o STF é o responsável por dar a última palavra sobre a constitucionalidade de um imposto e anos depois ele decide que o tributo é constitucional, qual seria o problema?


A principal agrura dessa situação reside na falta de segurança jurídica que o contribuinte brasileiro terá de enfrentar de agora em diante. Não basta mais ingressar com uma ação no Poder Judiciário, vencer a ação e ter coisa julgada formada sobre a matéria. Anos depois, a depender do entendimento do STF, o contribuinte pode ver a situação mudar completamente, mesmo que já tenha uma decisão, em tese, imutável, que dizia como as coisas deveriam ocorrer.


E a situação ainda pode piorar. O que ocorre quando o STF tinha uma decisão firme no sentido de que determinado tributo era inconstitucional, mas, anos depois, resolve alterar o próprio entendimento? A partir de quando o Fisco poderá realizar a cobrança do tributo? Ele poderá cobrar valores de períodos anteriores à decisão do STF ou apenas após a decisão?


Imagine a surpresa de João, certo de que não tinha mais que pagar o imposto pois havia ingressado com ação no Judiciário (e vencido a discussão), ao receber uma notificação de cobrança de milhares de reais deste mesmo imposto.


A conclusão é clara: o contribuinte não tem segurança jurídica no Brasil. A previsibilidade e coerência da aplicação do Direito Tributário em território nacional é algo cada vez distante da realidade, pois, ainda que se obtenha uma decisão judicial favorável sobre algo, isso pode ser automaticamente revertido sem mais nem menos, sem qualquer aviso prévio.


Tamanha insegurança jurídica é um péssimo fator para o ambiente de negócios de maneira geral e pode representar o afastamento de muitos investimentos. Um cenário previsível e estável traz mais investimentos pois as empresas sabem com o que irão lidar. No Brasil, contudo, a única coisa da qual se pode ter certeza é que o contribuinte viverá em total incerteza.

 

Publicidade

Publicidade

Leia também

bottom of page